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A teoria sugere e a
prática demonstra que não basta o conhecimento razoável, nem mesmo o perfeito
domínio, de qualquer língua estrangeira, para fazer um bom tradutor: o grande
número de traduções de má qualidade, cheias de erros grosseiros, que o leitor
já deve ter observado tantas vezes nas traduções de filmes para a televisão,
principalmente, é uma prova inequívoca disso.
Famoso é o caso daquele
filme de televisão em que a polícia invade a residência de um dos implicados na trama criminosa, e um dos policiais abre com fúria uma porta que estava
fechada; então o chefe da patrulha pergunta se havia alguém lá dentro, e o
policial responde: “Pessoa!” (Era um filme francês, e o policial teria respondido,
no original, “personne” — que se pode traduzir como “pessoa”, literalmente, mas
no caso a tradução correta seria “ninguém”...)
É verdade que as traduções de filmes para televisão não costumam dar
os nomes dos tradutores responsáveis por tais e tantos atentados contra a
língua e contra o próprio bom-senso; o que se ouve dizer, em geral, é que se
trata de uma “versão brasileira” de tal ou qual laboratório cinematográfico
especializado. Esse anonimato acoberta, por um lado, os maus tradutores; e, por
outro lado, permite a esses “laboratórios” e empresas afins, usuários do
trabalho de tradutores despreparados, pagar-lhes muito menos do que teriam de
pagar a profissionais conscientes da tradução. E assim presta-se, através do
mais popular dos veículos de comunicação de massa, um lastimável desserviço à
causa da tradução e dos bons tradutores.
Para evitar que as
traduções continuem a ser malfeitas e mal remuneradas é que existem, em número
cada vez maior, as escolas de tradução e as associações de tradutores.
Na França, a E.S.I.T.
(Escola Superior de Intérpretes e Tradutores) que pertence à Universidade da
Sorbonne, em Paris, traçou para os seus formandos em tradução um currículo que
inclui o estudo de três línguas obrigatórias, sendo a primeira delas a língua
pátria, e duas línguas estrangeiras; e conhecimentos gerais, sem os quais não
há tradutor que preste.
Não se traduz afinal de
uma língua para outra, e sim de uma cultura para outra; a tradução requer assim, do tradutor qualificado, um
repositório de conhecimentos gerais, de cultura geral, que cada profissional
irá aos poucos ampliando e aperfeiçoando de acordo com os interesses do setor
a que se destine o seu trabalho.
Dentro do estudo de cada
uma das línguas, a nacional e as estrangeiras, o estudante de tradução é
iniciado no domínio de técnicas especiais, e de alguns recursos dos quais
poderá valer-se no exercício da sua profissão, complementando assim o
conhecimento teórico com a experiência prática indispensável. Mesmo porque,
como se diz, tradução se aprende traduzindo.
Findo o seu curso, em
geral de três anos, o aluno aprovado recebe da E.S.T. um diploma de tradutor,
que faz dele um trabalhador qualificado em nível universitário.
Em muitos lugares onde a
tradução é hoje estudada a sério, em cursos que apresentam currículos
especializados, a mais moderna tendência é a de substituir-se a tradução dita “geral”,
que muitas vezes parte da tradução de textos literários — justamente os mais
difíceis de traduzir — pela tradução de textos “pragmáticos”, como os denomina
o francês Jean Delisle: textos nos quais o conteúdo é mais importante que a
forma. E também se tem observado o esforço dos que ensinam, no sentido de
fazer sentir, aos que aprendem, a distância que vai da tradução “escolar”, por
assim dizer, à tradução profissional.
Essa divisão dos textos
originais, em tipos nos quais o conteúdo é mais importante e tipos nos quais
mais importante é o aspecto formal, vem ocupando e preocupando estudiosos e pesquisadores em vários países.
No Brasil existem cursos
de tradução, em nível universitário, na Universidade de Brasília, como já foi
dito, e mais: nas Pontifícias Universidades Católicas do Rio de Janeiro e do
Rio Grande do Sul, na Universidade do Estado de São Paulo (em mais de um dos
seus campi), e em algumas instituições particulares de ensino superior.
Na Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro ensinou-se,
durante algum tempo, a disciplina “Técnicas de Tradução”, como parte do
currículo do curso de Editoração, atualmente desativado.
Uma das questões que no
Brasil certamente atrapalham a criação e a manutenção de cursos de tradução é a
falta de reconhecimento oficial da profissão de tradutor: sem esse estatuto profissional, a formação universitária de tradutores destina-se a formar
profissionais de nada, por assim dizer. E a falta de reconhecimento da
qualificação desses profissionais redunda por sua vez em aviltamento do mercado
de trabalho, beneficiando os usuários do produto dos tradutores, apesar de
todos os esforços que vem realizando, desde sua fundação há cerca de dez anos,
a Associação de Tradutores do Brasil (ABRATES).
Baseado
no livro O QUE É TRADUÇÃO de Geir Campos.
Editora
Brasiliense S.A.
R. General
Jardim, 160
01223 — São
Paulo — SP
Fone (011) 231
1422
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